“Fiquei paraplégica por causa de um furúnculo.” O alerta impactante veio de Jéssica Avelino, de 26 anos, ex-dançarina que teve a vida completamente transformada em 2023.
O que parecia ser apenas um pequeno ferimento no braço esquerdo acabou evoluindo de forma grave e irreversível: uma infecção bacteriana originada de um furúnculo atingiu sua medula espinhal, deixando-a paraplégica.
Na época, Jéssica morava em São Mateus, no Norte do Espírito Santo. Tudo começou com um machucado que ela mesma classificou como “pequeno” e que gerou dúvidas até entre pessoas próximas — algumas chegaram a sugerir que poderia ter sido uma picada de aranha.
Sem histórico anterior, ela não reconheceu o risco. No dia 11 de novembro de 2023, ao sentir fortes dores, decidiu espremer o local, achando que aliviaria o incômodo.
Por um breve momento, acreditou que o problema tinha sido resolvido: chegou até a brincar com o filho pequeno, Pietro, então com dois anos, e foi à praia. No entanto, o que se seguiu foi uma escalada de sintomas: dores nas costas, rigidez no pescoço, febre alta, vômitos e fraqueza progressiva.
Entre os dias 25 e 28 de novembro, ela buscou atendimento médico várias vezes, mas ainda sem diagnóstico preciso. No fim daquele mês, foi internada com suspeita de meningite no Hospital Roberto Silvares, onde exames revelaram a presença de uma bactéria na corrente sanguínea.
Ao ser questionada pelos profissionais sobre ferimentos recentes, lembrou do furúnculo, o que levou à realização de uma punção na medula. O exame confirmou que a infecção havia atingido a medula espinhal.
No dia 30 de novembro, a situação se agravou de forma drástica. Jéssica sentiu formigamento nas pernas, tentou andar, mas caiu e não conseguiu mais se levantar.
Foi levada às pressas à UTI já sem movimentos nos membros inferiores. O diagnóstico foi confirmado: mielite infecciosa — uma inflamação na medula causada por bactéria.
Foram sete dias em terapia intensiva e, depois, transferência para o Hospital Universitário Cassiano Antônio de Moraes (Hucam), em Vitória. Passou mais 20 dias internada, em tratamento com antibióticos. Uma cirurgia chegou a ser cogitada, mas não foi necessária.
Apesar de a infecção não ter continuado a subir e a medula não ter sofrido rompimento, a paralisia persistiu. Desde então, Jéssica vive uma nova realidade. Atualmente, ela reside em Curvelo, Minas Gerais, com a mãe, que a auxilia no dia a dia.
Sua rotina é de reabilitação intensa, intercalada com sessões no Hospital Sarah Kubitschek, em Belo Horizonte, onde fica internada anualmente por semanas para reavaliações e treinamentos de autonomia. O objetivo é reaprender a viver, com ou sem o retorno dos movimentos.
Antes da doença, Jéssica trabalhava como operadora de caixa e dançava em bandas capixabas, realizando apresentações de axé e swingueira. Hoje, mesmo com dores neuropáticas, espasmos e limitações físicas, ela segue dançando — agora sobre a cadeira de rodas.
Chegou a montar coreografias e se apresentar dentro do próprio hospital, mantendo viva sua paixão. A cada pequeno avanço, como a sensibilidade que voltou parcialmente à perna esquerda e ao toque quente ou frio, ela celebra.
Ainda há esperança de reversão, já que sua medula não foi lesada permanentemente, apenas inflamada. Os médicos dizem que ela pode voltar a andar, mas sem garantias.
Além da reabilitação, a casa do pai está sendo adaptada para recebê-la novamente em São Mateus. A mãe tenta vaga em creche para o neto, e Jéssica sonha em voltar a trabalhar e retomar a independência.
Ela aproveita seu caso para deixar um alerta importante: “Qualquer machucado deve ser avaliado por um profissional. A gente tenta resolver em casa, mas nunca imaginei que um furúnculo pudesse me deixar paraplégica.”
O dermatologista Ricardo Tiussi, presidente da Sociedade de Dermatologia no Espírito Santo, endossa a preocupação. Segundo ele, ainda que casos como o de Jéssica sejam raros, eles são possíveis, principalmente quando as pessoas manipulam furúnculos em casa.
A bactéria responsável, geralmente a Staphylococcus aureus, pode estar na pele de qualquer pessoa e, ao penetrar por ferimentos, cair na corrente sanguínea. Em situações de imunidade baixa — como em crianças pequenas, idosos, diabéticos ou pacientes com doenças autoimunes —, os riscos são maiores.
Mas mesmo pessoas saudáveis não estão imunes. Tiussi alerta: não se deve espremer, rasgar ou cortar furúnculos em casa. Ferramentas improvisadas, como lâminas ou objetos não esterilizados, aumentam o risco de infecção generalizada. “Bactérias podem alcançar órgãos vitais, como pulmões, cérebro e medula”, explicou.
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Os sinais de alerta são claros: febre, dor intensa, mal-estar, vermelhidão persistente, perda de apetite e formigamento devem levar o paciente imediatamente ao serviço médico.
“Não é comum, mas pode acontecer com qualquer ferimento. Até uma espinha, quando manipulada de forma errada, pode empurrar bactérias para dentro da corrente sanguínea”, concluiu o médico.
Hoje, Jéssica transforma sua experiência em lição de vida e resistência. Vive cada dia com gratidão e determinação. Para ela, o maior aprendizado foi valorizar o presente: “Não fico mais esperando voltar a andar para ser feliz. Quero aproveitar a vida agora, do jeito que posso. A paralisia não me parou, só me fez encontrar novas formas de continuar.”