Nas últimas semanas, o ambiente em torno da escolha do novo papa ganhou um tom quase místico, alimentado por velhas profecias e por um cenário global ansioso por sinais de mudança.
Enquanto milhões de católicos acompanhavam a sucessão ao pontificado, circulavam nas redes suposições que remetiam a manuscritos medievais e a números carregados de simbolismo, reacendendo teorias que associam líderes religiosos a desfechos apocalípticos.
Em um mundo conectado, até interpretações de textos centenários ganham nova vida, sobretudo quando se mistura tradição, estatísticas de alcance global e a sempre presente curiosidade sobre o futuro.
O anúncio oficial, feito em 8 de maio pelo Vaticano, confirmou o cardeal Robert Francis Prevost como sucessor de Francisco, elevado ao nome de Papa Leo XIV.
Aos 69 anos, natural dos Estados Unidos e também cidadão peruano, ele é reconhecido por dedicar parte significativa de sua trajetória ao atendimento de comunidades vulneráveis na América do Sul.
A notícia foi saudada com celebrações em Lima e em paróquias norte-americanas, ao mesmo tempo em que acendeu alertas entre aqueles que veem nos encontros de símbolos, como a escolha do numeral “XIV” logo após o pontífice anterior ter adotado o nome Leão XIII — indícios de um desfecho profético.
O ponto de convergência das teses está na chamada “Profecia dos Papas”, atribuída ao arcebispo São Malaquias, do século XII, que lista 112 possíveis pontífices até uma figura final apelidada de “Pedro, o Romano”.
A coincidência de Leo XIV ser numericamente o 112º nessa contagem online suscitou questionamentos sobre um suposto apagamento de Roma e o juízo final.
Segundo a previão de 1000 anos, este seria um pontificado marcado por catástrofes globais, seguidas pelo “juízo final”. A lista terminaria com a destruição de Roma, o que marcaria o fim dos tempos.
Entretanto, a discrepância entre o nome de batismo de Prevost e a alcunha “Pedro” e sua dupla nacionalidade destoam da descrição original, o que leva especialistas a classificarem essa leitura como descabida.
Estudos históricos apontam que o catálogo de Malaquias só se tornou público no século XVI, o que sugere uma autoria posterior ao arcebispo. Ainda assim, fóruns na internet continuam a relacionar pandemias, conflitos e eventos climáticos a supostos sinais proféticos.
Para evitar a propagação de informações enganosas, teólogos e analistas recomendam atenção ao contexto histórico e à diferenciação entre críticas literárias e previsões literais.
No momento em que o Papa Leo XIV inicia seu pontificado diante de desafios como a renovação do diálogo com jovens fiéis, a luta contra abusos e a integração de culturas diversas, torna-se fundamental cultivar o discernimento.
Antes de procurar respostas em textos do passado, cabe à sociedade concentrar esforços na construção de um presente mais transparente e inclusivo, minimizando o espaço para narrativas conspiratórias que, embora fascinantes, podem distorcer a realidade.